segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

VIVER A QUARESMA



A Quaresma é um dom de Deus para os crentes, pois num mundo cada vez mais materialista e agnóstico, temos uma oportunidade de nos purificar e de nos santificar. Para viver em plenitude esta Quaresma, aqui transcrevemos alguns excertos da Mensagem de Bento XVI, esperando que a mesma nos ajude a celebrar frutuosamente este tempo:

É já na próxima Quarta-feira, dia 17, que com a Imposição das Cinzas damos início a mais uma Quaresma. Este Tempo Litúrgico é um dom de Deus para os crentes, pois num mundo cada vez mais materialista e agnóstico, temos uma oportunidade de nos purificar e de nos santificar. Para viver em plenitude esta Quaresma, e simultaneamente para preparar a festa da Páscoa, aqui transcrevemos alguns excertos da Mensagem de Bento XVI, esperando que os mesmos nos ajudem a celebrar frutuosamente este tempo:
“Queridos irmãos e irmãs: Todos os anos, por ocasião da Quaresma, a Igreja convida-nos a uma revisão sincera da nossa vida à luz dos ensinamentos evangélicos . Este ano desejaria propor-vos algumas reflexões sobre o tema vasto da justiça, partindo da afirmação Paulina: A justiça de Deus está manifestada mediante a fé em Jesus Cristo.
Detenho-me em primeiro lugar sobre o significado da palavra “justiça” que na linguagem comum implica “dar a cada um o que é seu (dare cuique suum)”, segundo a conhecida expressão de Ulpiano, jurista romana do século III. Porém, na realidade, tal definição clássica não precisa em que é que consiste aquele ‘suo’ que se deve assegurar a cada um. Aquilo de que o homem mais precisa não lhe pode ser garantido por lei. Para gozar de uma existência em plenitude, precisa de algo mais íntimo que lhe pode ser concedido somente gratuitamente: poderíamos dizer que o homem vive daquele amor que só Deus lhe pode comunicar, tendo-o criado à sua imagem e semelhança. São certamente úteis e necessários os bens materiais – no fim de contas o próprio Jesus se preocupou com a cura dos doentes, em matar a fome das multidões que o seguiam e certamente condena a indiferença que também hoje condena centenas de milhões de seres humanos à morte por falta de alimentos, de água e de medicamentos -, mas a justiça distributiva não restitui ao ser humano todo o ‘suo’ que lhe é devido. Como e mais do que o pão ele de facto precisa de Deus. Nota Santo Agostinho: se ‘a justiça é a virtude que distribui a cada um o que é seu […] não é justiça do homem aquela que subtrai o homem ao verdadeiro Deus’.
O evangelista Marcos refere as seguintes palavras de Jesus, que se inserem no debate de então acerca do que é puro e impuro: ‘Nada há fora do homem que, entrando nele, o possa tornar impuro. Mas o que sai do homem, isso é que o torna impuro. Porque é do interior do coração dos homens, que saem os maus pensamentos’. Para além da questão imediata relativo ao alimento, podemos entrever nas reacções dos fariseus uma tentação permanente do homem: individuar a origem do mal numa causa exterior. Muitas das ideologias modernas, a bem ver, têm este pressuposto: visto que a injustiça vem ‘de fora’, para que reine a justiça é suficiente remover as causas externas que impedem a sua actuação: Esta maneira de pensar - admoesta Jesus – é ingénua e míope. A injustiça, fruto do mal, não tem raízes exclusivamente externas; tem origem no coração do homem, onde se encontram os germes de uma misteriosa conivência com o mal. [...] o homem torna-se frágil por um impulso profundo, que o mortifica na capacidade de entrar em comunhão com o outro. Aberto por natureza ao fluxo livre da partilha, adverte dentro de si uma força de gravidade estranha que o leva a dobrar-se sobre si mesmo, a afirmar-se acima e contra os outros: é o egoísmo, consequência do pecado original. Adão e Eva, [...] substituíram à lógica de confiar no Amor aquela da suspeita e da competição; à lógica do receber, da espera confiante do Outro, aquela ansiosa do agarrar, do fazer sozinho experimentando como resultado uma sensação de inquietação e de incerteza. Como pode o homem libertar-se deste impulso egoísta e abrir-se ao amor?
O anúncio cristão responde positivamente à sede de justiça do homem [...]; o cristão é levado a contribuir para a formação de sociedades justas, onde todos recebem o necessário para viver segundo a própria dignidade de homem e onde a justiça é vivificada pelo amor.
Que este tempo penitencial seja para cada cristão tempo de autêntica conversão e de conhecimento intenso do mistério de Cristo, que veio para realizar a justiça.”

nº 741 I 14 Fevereiro ‘10

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