segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

A ÁGUA E O ESPÍRITO



O Baptismo de Jesus prefigura o nosso, no sentido de que, assim como naquele momento o Pai declarou a filiação divina de Jesus ungindo-O com o Espírito antes de iniciar a sua missão, também nós no Baptismo somos consagrados filhos de Deus em Jesus Cristo pelo Espírito Santo, e assim recebemos o compromisso da missão. No entanto, muitas vezes parece que somente recebemos o Baptismo de água e não o do Espírito Santo.

Neste Domingo depois da Epifania celebramos a Festa do Baptismo do Senhor, com que se encerra o ciclo litúrgico do Natal.
O Tempo da infância de Jesus já passou, agora Ele vai iniciar uma nova etapa na sua vida, vai dar início à sua missão, à missão que o Pai Lhe confiou, quando O enviou ao encontro dos homens. Esta festa situa-se perfeitamente no contexto das celebrações de Natal-Epifania, pois é mais uma manifestação de Jesus Cristo.
É verdade que quer no Natal quer na Epifania, o Jesus que se revela e manifesta aos homens é apenas uma criança, como aconteceu em Belém, quando foi revelado aos pastores, e como aconteceu com a adoração dos Magos. Agora uma nova Epifania, mas com Jesus já adulto, pelo que me atreveria a dizer que no Natal Jesus se revela às crianças (as festas de Natal-Epifania falam da infância de Jesus e são também as festas em que mais vibram as crianças), e agora manifesta-se aos cristãos mais adultos.
A cena do baptismo que São Lucas nos oferece apresenta um claro paralelismo com o que ele mesmo descreverá como o acontecimento inicial da Igreja, o Pentecostes, atribuindo a João a profecia: “Eu baptizo-vos com água, mas vai chegar quem é mais forte do que eu[…] Ele baptizar-vos-á com Espírito Santo e com o fogo”, procurando sublinhar o início da missão profética de Jesus Cristo, que depois continuará na Igreja através dos seus discípulos.
De facto o baptismo era um rito de penitência, onde as pessoas eram imersas na água, como sinal de querer iniciar uma vida nova. Por isso o Baptismo de Jesus tem um conteúdo e um sentido próprio que o diferenciam do sentido e significado do baptismo cristão. Mas também é certo que este baptismo de Jesus de alguma maneira prefigura, e inevitavelmente evoca, o nosso baptismo.
Embora, o baptismo de João fosse uma expressão do desejo de conversão, o facto de Jesus se colocar na fila dos pecadores é mais um sinal da encarnação de Deus entre os homens, Ele que não necessitava de qualquer purificação identifica-se com todos os que querem converter-se.
Se é verdade que Jesus se submeteu ao baptismo da água o mais importante é a teofania que tem lugar no Baptismo de Jesus, quando o Espírito, em forma de pomba, desce sobre Ele. Embora Jesus se tenha submetido ao baptismo de João como muitos outros judeus do seu tempo, a verdade é que há algo diferente, quando a voz do Pai se faz ouvir: “Tu és o meu Filho muito amado, em Ti pus toda a minha complacência”.
De alguma maneira, o Baptismo de Jesus prefigura o nosso, no sentido de que, assim como naquele momento o Pai declarou a filiação divina de Jesus ungindo-O com o Espírito antes de iniciar a sua missão, também nós no Baptismo somos consagrados filhos de Deus em Jesus Cristo pelo Espírito Santo, e assim recebemos o compromisso da missão.
Contudo, nos dias que correm muitos cristãos adultos, parecem continuar a viver uma fé de criança. Parece que não querem deixar o idílio do presépio de Belém, ou continuar a contemplar o Menino como o fizeram os Magos.
Há falta de compromisso cristão; a vida de cada dia em vez de ser um testemunho da fé no Filho de Deus, tantas vezes se revela como uma negação do amor do Pai, fonte de bondade e perdão.
Vão-se esquecendo os valores cristãos, como se nos tivéssemos esquecido dos nossos compromissos baptismais, porque os valores materialistas e hedonistas vão sentando arrais nas nossas vidas. Por isso não admira que vivamos num mundo tão confuso, onde grassa o egoísmo, a exploração, num mundo onde a criminalidade campeia, e os nossos lamentos aumentam, como se nós não tivéssemos nada a ver com toda esta situação!
Certamente que todos nós, muito ou pouco, temos que responder por todas essas situações, pois tantas vezes nos tem faltado a coerência com a fé do nosso baptismo!
Por vezes chego a pensar que nós, outrora, como no Jordão, somente fomos baptizados na água e que não recebemos o Baptismo do Espírito Santo, que João já então profetizara.

nº 736 I 10 Janeiro ‘10

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